quinta-feira, 17 de julho de 2014

Voto branco, nulo e abstenção eleitoral: a nova oposição

Ainda que se considere legítimo o aumento dos tipos de voto em questão, bem como da mera abstenção eleitoral, é crucial que o eleitor perceba as consequências dessa forma de participação política. O distanciamento político-eleitoral não necessariamente implica a obrigatoriedade de revisão do atual modelo político, de modo que o que se visa combater pode igualmente ser fortalecido quando o eleitorado afasta-se das urnas e do debate político como um todo.
Ao longo das últimas três eleições (2002, 2006 e 2010), o "não voto" parece ter emergido como umas das principais vozes de oposição. Trata-se de uma negativa conferida por parte do eleitorado aos modos usuais de se fazer política, abarcados, neste caso, tanto os partidos e candidatos quanto o próprio modelo de representação em si. O "não voto" manifesta-se, comumente, na forma do voto em branco ou nulo ou por meio da abstenção eleitoral, e contribuem para o seu crescimento três variáveis: 1) O descrédito do eleitorado em relação aos partidos políticos e aos candidatos; 2) Os altos índices de percepção da corrupção; e 3) A ideia equivocada de que o voto em branco ou nulo, se iguais ou superiores a 51% dos votos, invalidam o processo eleitoral.
Dois cenários
Quanto a primeira variável, é importante ressaltar que ela tangencia dois cenários: a reprovação à política de forma geral, o que inclui tanto os partidos governistas quanto os de oposição; e a falta de confiança, especificamente, em relação a partido (s) e/ou candidato (s) que possa (m) servir como alternativa àquele (s) que se encontram no poder.
Corrupção
O segundo ponto que pode explicar a tendência de crescimento dos votos brancos e nulos e das abstenções recai sobre a percepção acerca da corrupção. Em 2013, o Brasil se manteve estável no Índice de Percepção da Corrupção, pesquisa promovida pela Transparência Internacional, ONG cujo principal objetivo é a luta contra a corrupção. Entre os 177 países avaliados, o Brasil alcançou a 72ª colocação, com 42 pontos; pontuação inferior a países como Canadá (81), Uruguai e Estados Unidos, ambos com 73, e considerada baixa para um país de alta relevância global como o Brasil.
Descrédito
Tal percepção, aliada ao descrédito nas instituições, reverte-se na descrença na própria política, afastando os eleitores do debate em torno de temas cruciais ao País e os levando a procurar outras formas de representação que não as mais tradicionais. Em termos concretos, esse afastamento resulta em um alarmante aumento no número de votos brancos e nulos, que só não são maiores que os altos índices de abstenção nas urnas. Em 2010, por exemplo, 18,12% (24,6 milhões) dos eleitores não votaram. Já os votos brancos atingiram 3,13% (3,4 milhões) naquele ano. Os votos nulos, apesar de estarem em constante queda se analisadas as últimas três eleições, registraram 5,51% (6,1 milhões).

Confusão
O terceiro fator determinante para o crescimento de votos brancos e nulos recai sob a falsa alegação – fundamentada no artigo 224 do Código Eleitoral – de que tais tipos de voto, se superiores a 51% do total de votos, provocariam o cancelamento e remarcação do pleito eleitoral. Parte do eleitorado, movido por angústias e desgostos em relação à política, vale-se desse argumento como forma de protesto. A confusão, fruto da má informação, decorre do fato de que, antigamente, quando as eleições eram realizadas com o uso de cédulas de papel, era comum as cédulas, inicialmente preenchidas em branco, serem fraudadas para favorecer determinado candidato. Assim, recorria-se à rasura da cédula como forma de anulação do voto. O Tribunal Superior Eleitoral é taxativo ao afirmar que, na prática, os votos nulos assumem a mesma conotação dos votos brancos, já que não entram no cômputo de votos válidos.

Insatisfação
Percebe-se que as três variáveis citadas têm como denominador comum a insatisfação popular em relação às formas tradicionais de se praticar a política, de modo que, quando forçados a comparecerem às urnas, os eleitores descontentes não têm outra alternativa que não a anulação do voto, haja visto que nenhum partido ou candidato, de forma geral, é digno de sua confiança.

Descaso
O que se pode questionar é justamente a racionalidade do voto em branco ou nulo, bem como da abstenção nas urnas, uma vez que, além de não serem computados como votos válidos, tais tipos de voto podem favorecer determinado candidato cuja vitória não seria bem aceita por aquele eleitor. A adoção do voto em branco ou nulo, ou até mesmo a abstenção, torna-se muito mais um instrumento de descaso e de inação política do que propriamente uma forma de manifestação.

Distanciamento
O crescimento do voto em branco, nulo e da abstenção eleitoral, parece sugerir que o eleitorado encontrou no distanciamento das instituições a resposta para manifestar o seu descontentamento ante a um modelo que, insistentemente, tenta sugerir candidatos e propostas cujas bases de sustentação política não têm consonância com o que, de fato, quer e pensa o restante da população.
Por fim, ainda que se considere legítimo o aumento dos tipos de voto em questão, bem como da mera abstenção eleitoral, é crucial que o eleitor perceba as consequências dessa forma de participação política. O distanciamento político-eleitoral não necessariamente implica a obrigatoriedade de revisão do atual modelo político, de modo que o que se visa combater pode igualmente ser fortalecido quando o eleitorado afasta-se das urnas e do debate político como um todo.

Thiago Vidal é bacharel em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB) e assessor legislativo da Queiroz Assessoria Parlamentar e Sindical

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